A incineração é o jeito mais caro e poluentede gerir resíduos ou gerar energia.1 Não há necessidade de queimar qualquer tipo de resíduo, já que existem alternativas mais seguras para todos os materiais, que não envolvem a sua queima. Estes incluem tanto recicláveis quanto compostáveis, como papel, plásticos, vidro, metais, restos de comida e resíduos de quintal.
“De Lixo a Energia” é um termo de relações públicas usado para promover a incineração,2 mas os resíduos não se transformam em energia num passe de mágica. De cada 100 toneladas de lixo queimado, cerca de 70 toneladas se tornam poluição do ar.3 As outras 30 toneladas se tornam cinzas tóxicas que tipicamente são lançadas em aterros sanitários, tornando-os mais danosos que se todo o lixo fosse para lá sem ser queimado. E o que é pior: parte das cinzas é usada em programas perigosos de reuso de cinzas.
Incineradores são na verdade enormes “desperdiçadores” de energia, já que reciclar e compostar os materiais queimados economizaria de 3 a 5 vezes mais energia, ao não se recriar produtos a partir da extração de matérias primas.4 Estratégias de resíduo zero como reciclagem e compostagem criam de 5 a 10 vezes mais empregos por tonelada de resíduo que incineradores ou aterros sanitários. Ao desviar materiais descartados (e investimentos) da reciclagem, os incineradores estão queimando empregos muito necessários.5
Por mais imunda que seja a queima de carvão mineral, a incineração de lixo é ainda pior, a despeito de incineradores em média serem muito mais novos e de terem controles adicionais de poluição. Para produzir a mesma quantidade de energia que o carvão, incineradores de lixo liberam 2,5 vezes mais dióxido de carbono e níveis muito mais altos de dioxinas, mercúrio, chumbo, cádmio, monóxido de carbono, óxidos de nitrogênio e ácido clorídrico.6
Incineradores também são muito piores que lançar os mesmos materiais diretamente em aterros sanitários, em termos de emissões de gases do efeito estufa e de emissões de químicos tóxicos, óxidos de nitrogênio, particulados, gases ácidos e químicos que criam smog (neblina tóxica porque combinada com poluentes do ar). E isso mesmo quando é necessário transportar os resíduos por grandes distâncias até chegar aos aterros sanitários.7
Estudos de saúde pública têm mostrado que morar perto de incineradores aumenta a incidência de malformações congênitas, partos prematuros, disfunções reprodutivas, doenças respiratórias e mortes em geral, especialmente de câncer.8 A poluição tóxica de incineradores também contamina a cadeia alimentar. Dioxinas, os químicos mais tóxicos conhecidos pela ciência, são liberados principalmente pela queima, e podem se deslocar por milhares de quilômetros. Elas têm vida longa e são lipossolúveis, causando sua bioacumulação na cadeia alimentar, e podem causar câncer, malformações congênitas, aborto, endometriose, diabete, distúrbios de aprendizagem, problemas pulmonares, disfunções de pele, baixos níveis de testosterona e muito mais.9 Mais de 90% da exposição humana a dioxinas se dá por meio da ingestão de carnes e derivados do leite, onde elas se concentram.10
Nos Estados Unidos, incineradores impactam as populações no-brancas desproporcionalmente, especialmente as Negras. Análises da rede Energy Justice Network indicam que 78% dos incineradores de lixo dos Estados Unidos ficam em comunidades onde a proporção de pessoas não-brancas é maior que a média nacional, e que 35% ficam em comunidades onde pessoas não-brancas são a maioria.11 Incineradores são mais caros de construir e operar que aterros sanitários ou qualquer outra forma de geração de energia (ver Gás de Aterro para Energia).12, 13 Considerando o endividamento necessário para financiá-lo, um incinerador de lixo novo de grande porte pode custar cerca de US$1 bilhão. Esses custos sempre são pagos com dinheiro público, e alguns municípios já tiveram que enfrentar a falência financeira devido aos custos de incineradores.14, 15 Ao contrário de aterros sanitários, incineradores precisam ser alimentados continuamente com uma certa quantidade de lixo para funcionar, por isso são comuns as cláusulas contratuais chamadas de “ponha ou pague” (put or pay), que obrigam as comunidades a fornecer uma certa quantidade de resíduos, ou pagar assim mesmo. Isso penaliza municípios que têm êxito em seus esforços de redução de resíduos, permitindo que os incineradores aceitem resíduos de outros locais e sejam pagos em dobro pela mesma capacidade.
A incineração é uma indústria que está morrendo, presente principalmente no Japão, Coréia do Sul, Europa, Canadá e Estados Unidos. Centenas de incineradores antigos foram fechados pelo mundo afora, e a indústria só consegue construir novas unidades em países que as subsidiam. O único país onde há propostas de proliferação de queima de resíduos é a China, onde centenas de novos incineradores de lixo e biomassa foram propostos nos últimos anos. Nos Estados Unidos, a oposição das comunidades é tão forte que nem um incinerador de lixo foi construído num novo local desde 1995, apesar de centenas de tentativas. Com a exceção de algumas raras expansões em locais já existentes, a indústria enxerga seu futuro principalmente na Ásia, Austrália e partes da Europa.
Incapaz de concorrer economicamente com aterros sanitários ou com outras formas de energia, a indústria de incineradores é amparada por uma série de subsídios, inclusive contratos monopolistas, isenções de poluição do ar, falsas designações como operações de reciclagem e políticas climáticas baseadas na falsa contabilidade de impactos climáticos. Políticas de energia renovável também alocam dinheiro de contas de eletricidade a incineradores em estados onde a indústria foi “abençoada” com a designação de geradora de energia renovável, reduzindo os recursos que deveriam ir para energias renováveis de verdade, como a eólica e a solar. A indústria também adotou estratégias de sobrevivência tais como queimar tipos mais perigosos de resíduos que alcançam tarifas de descarte mais altas.
As Novas Direções da Incineração
Os Combustíveis Derivados de Resíduos (CDR) são uma tecnologia antiga que ressurgiu. Ela envolve retirar o vidro e metais que não queimam e transformar os materiais combustíveis (papel e plásticos, principalmente) em pellets de combustível. Esses pellets de lixo são queimados num incinerador normal (onde a poluição é comparável à da queima normal de lixo), ou são vendidos como combustível para fornos de cimento ou usinas termelétricas que queiram substituir o carvão mineral. Usinas de papel com uso intensivo de energia e fornos de cimento e agregados há muito queimam combustível derivado de pneus (TDF – tire-derived fuel), e nas últimas décadas os fornos também têm funcionado como depósitos de baixo custo para resíduos perigosos. Agora, plásticos de difícil reciclagem estão sendo comercializados para fornos de cimento e siderúrgicas como “combustível derivado de plástico” (PDF – plastic-derived fuel). Uma brecha regulatória da Agência de Proteção Ambiental (EPA – Environmental Protection Agency) no governo Obama (a regra dos “materiais secundários não perigosos”) tem estimulado uma ampla gama de resíduos a serem queimados como “combustíveis” em fornos industriais sem serem regulamentados como incineradores de resíduos.
Tecnologias experimentais de incineração – pirólise, gaseificação e arco de plasma – são propostas há vários anos por empresas novas que alegam que estas tecnologias não são incineração. Às vezes elas alegam que não há chaminé ou que suas emissões são “quase zero.” Contudo, essas tecnologias são definidas e reguladas como incineração tanto nos Estados Unidos quanto na Europa. Em resumo, elas dividem a combustão em duas etapas. Primeiro, elas usam calor e pressão para transformar o resíduo em “gás de síntese”, que em seguida é queimado. Estas tecnologias têm se mostrado um fracasso do ponto de vista técnico e econômico.16 Elas são mais caras que os incineradores normais e não foram desenvolvidas exitosamente em escala comercial. Pequenas usinas piloto foram construídas, mas dão muita manutenção e não conseguem operar continuamente com qualquer material que não seja bem homogêneo. Numerosas tentativas de processar plásticos ou pneus fracassaram, embora tais materiais sejam muito mais consistentes que o lixo. Apesar dos fracassos contundentes e dos problemas de poluição atmosférica inerentes a incineradores, muitas empresas continuam a cortejar autoridades locais desesperadas por desenvolvimento econômico ou soluções “verdes” de manejo de resíduos. Elas acabam por desperdiçar tempo e recursos públicos explorando esses “incineradores disfarçados” experimentais.
Esquemas “de lixo a combustíveis” (WTF – waste-to-fuels) também estão começando a surgir após um par de décadas de tentativas e erros. Agora chamadas de “tecnologias de conversão de lixo”, as tecnologias WTF frequentemente começam com a pirólise ou gaseificação. Em vez de queimar o gás de síntese numa segunda etapa, elas convertem-no em combustíveis líquidos como querosene de aviação, nafta, óleo diesel, hidrogênio e/ou outros químicos. Resíduos sólidos são frequentemente comercializados como se fossem desejados como materiais de construção ou então são queimados in loco. Alguns processos de WTF usam hidrólise ácida, etanol celulósico ou outros processos de fermentação com a meta de produzir biocombustíveis. Com a crescente consciência pública sobre a poluição por plásticos, incluindo a proliferação de plásticos de uso único e as gigantescas massas remoinhosas de plástico em todos os oceanos do mundo, estamos testemunhando o crescimento de um campo de propostas de “reciclagem química” usando esses processos de WTF. Essas tecnologias ainda são experimentais e, em última instância, envolvem combustão (e poluição do ar), destruição de materiais recicláveis e compostáveis, aumento de toxicidade e produção de resíduos sólidos.17